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sexta-feira, 19 de junho de 2015

Glaydson, o Vampiro Natalense: uma nova chance




           Já não tinha vida, mas o seu coração batia de pavor num pulsar frenético. Lord Sevlá, um vilão terrível, iria transformar a breve história de Glaydson em pó. Estava pronto para matá-lo com um golpe vorpal quando foi avertido por Gabriele, a vampira mais jovem do grupo.
           – Não o mate, meu senhor! Eu suplico.
       – Como assim? Ele está botando a nossa sobrevivência em jogo. Demoramos muito tempo para controlar os caçadores daqui... ninguém sabe que existimos... por conta deste energúmeno, vão começar a questionar novamente a existência de vampiros no Rio Grande do Norte.
            – Eu vejo alguma utilidade nele.
            – Qual?
           – Não sei... apenas uma sensação de que este sujeito asqueroso ainda nos será muito útil.
            – Mais uma de suas visões, Gabriele?
            – Não sei se uma visão, meu senhor... é uma sensação.
         Os demais membros do conselho – se é que se pode chamar toda representatividade de um grupo de conselho – decidiram manter Glaydson vivo... pelo menos por um tempo. É claro que não era preciso conselho nenhum, pois quem decidia o destino de todos nas terras potiguares era o Lorde Sevlá.
 – Tudo bem, Gabriele. No entanto, ele é responsabilidade sua. Trate de ensiná-lo como se portar...
– Perdão, meu senhor, mas eu tenho uma sugestão antes.
– Diga, Conrado. O que você tem a dizer?
– Sugiro deixá-lo passar a noite comigo. Garanto que ele aprenderá a se portar.
Não houve objeção. Conrado era um sujeito calado, às vezes ficava dias sem abrir a boca... falava tão pouco que, quando falava, todos ouviam prontamente, mesmo que besteiras fossem comuns. Além do seu jeito calado, este vampiro era conhecido pelas suas técnicas de tortura que vieram se aprimorando desde a Idade Média. Ensinou muita coisa aos militares brasileiros à época do Regime. Ele falava pouco, mas poderia fazer qualquer criatura até agora conhecida confessar qualquer coisa sob os seus métodos. Na verdade, ninguém sabia como aquele experiente soldado do mal tinha ido parar nordeste brasileiro, mas seus serviços eram muito úteis ao Lord Sevlá e a qualquer senhor que lhe contratasse a preços nada amigáveis.
Glaydson, coitado, não sabia o que lhe esperava. Os dias em que passou livre em Natal desfrutando dos poderes que recebeu após a sua transformação o fizeram acreditar que nada poderia abalar a sua felicidade. Mas ele não sabia da existência de outros vampiros na região, não poderia prever a perseguição liderada pelo Lord Sevlá e muito menos a noite que passaria sob os cuidados de Conrado.
O fato de vampiros se recuperarem bem mais rápido de ferimentos físicos do que um ser humano não os ajuda a sentir menos dor. Conrado começou amarrando as suas mãos e pés com uma corrente bastante poderosa... mesmo que o Glaydson soubesse usar a força que tem, não conseguiria se soltar. Em seguida, um maçarico antigo foi aceso... ninguém sabe o que era maior, a dor ou os gritos. Gritos ensurdecedores ecoavam pela fazenda longínqua no interior do interior do Rio Grande do Norte. A densa floresta plantada e irrigada pelas adutoras do Lord Sevlá não deixava o grito se expandir...
Depois de se esbaldar com o maçarico, Conrado pegou um dos seus pequenos instrumentos favoritos: uma faquinha de cozinha meio cega. Os cortes precisavam mais de força do que de fio para serem feitos, e doíam muito mais. Ameaçou arrancar os olhos, tirou a ponta da faca no último segundo. Lágrimas de sangue escorriam pelo rosto de Glaydson, lágrimas de felicidade escorriam dos olhos brilhantes de Conrado.
A noite foi passando, parecia interminável. Conrado dava, controladamente, um pouco de sangue para que Glaydson se mantivesse vivo... Não seria nada legal descumprir uma ordem do Lord Servlá, mesmo que ele não lhe impusesse medo algum. O jovem vampiro de Natal deveria apenas aprender uma lição, ainda que não conhecesse as regras do jogo para merecer uma punição. Pouco importava, o sofrimento alheio era mais importante do que qualquer senso de justiça. Que justiça? Há séculos fazia apenas o que achava prazeroso. Sentiu muito prazer naquela noite, usou uma dúzia de métodos diferentes para extrair o sofrimento do torturado.
Com ossos quebrados, pele queimada, carne arrancada e orgulho ferido, Glaydson achava que aquele sofrimento não iria terminar nunca. De certa forma, nunca terminaria... ficaria preso em sua memória até o dia em que deixaria, enfim, de habitar este mundo. Como castigo final e para protegê-lo do sol, Conrado aprisionou sua vítima numa de suas virgens de ferro. Na mais fina, para que pudesse ouvir os gritos de Glaydson durante todo o dia, quando descansaria no seu caixão de veludo. Quando se recuperasse, Glaydson teria a primeira missão a mando do Lord Sevlá, mas, por enquanto, padecia sem poder morrer naquela mórbida santa. 

Confira a parte anterior aqui

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